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INTRODUÇÃO

1. NEW JOURNALISM
1.1 As origens do New Journalism
1.2. Talese, Wolfe e Breslin e o surgimento do New Journalism
1.3. Capote e Mailer reforçam o time
1.4. Definições e Características

2. GONZO JOURNALISM
2.1. Hunter S. Thompson e as origens do Gonzo Journalism
2.2 O que é Gonzo Journalism?

3. GONZO JOURNALISM VS. NEW JOURNALISM
3.1. A Imersão e A Osmose
3.2. A Captação Participativa
3.3. Foco Narrativo
3.4. Sarcasmo e Sobriedade
3.5. Ficção e Não-ficção
3.6. O uso de drogas no Gonzo Journalism
3.7. A fuga do foco principal
3.8. Epígrafes, pseudônimos e ilustrações Gonzo

CONCLUSÃO

OBRAS CONSULTADAS



1. NEW JOURNALISM


1.4. Definições e Características

Ainda que não seja reconhecido como um movimento literário pelos próprios protagonistas, foi assim que o New Journalism entrou para a história. Uma vez batizado e reconhecido como fenômeno, o New Journalism adquiriu um caráter de legitimidade e, portanto, começou a ser pesquisado e conceituado por diversos autores, como Tom Wolfe, Mark Kramer e Edvaldo Pereira Lima. Antes de definir o que é New Journalism, contudo, é importante fazer a observação de que não se trata de um gênero absolutamente inédito e sim parte da evolução da literatura que busca inspiração na literatura de realismo social, na literatura de relato e nas manifestações literárias com caráter factual e informativo - e portanto, jornalístico, que convencionou-se chamar, modernamente, de Jornalismo Literário, caracterizado pelo uso de técnicas da literatura na captação, redação e edição de reportagens e ensaios jornalísticos. Edvaldo Pereira Lima, no texto New Journalism X Jornalismo Literário, publicado no site Jornalite - Portal de Jornalismo Literário no Brasil, diz que:

O new journalism americano foi a manifestação de um momento do Jornalismo Literário. Isso quer dizer que o JL, enquanto forma de narrativa, de captação do real, de expressão do real já existia antes e continua existindo após o new journalism, que foi só uma versão específica do JL, mas uma versão radical quando comparada à anterior, principalmente, no que se refere à capacidade do narrador se envolver com o universo sobre o qual vai escrever. (2002)

A influência que a literatura de ficção européia do século XIX exerce sobre o New Journalism é verificada especialmente na forma com que o material é coletado. A escola do realismo social caracterizou-se pelas longas e detalhadas pesquisas de campo que os escritores faziam antes de escrever. No artigo Apontamentos Breves Para Uma Futura História do Jornalismo Literário, também publicado no site Jornalite, Edvaldo Pereira Lima afirma que "Suas histórias nasciam dessa observação minuciosa da realidade" (2002). Antes de escrever um livro, o escritor inglês Charles Dickens realizava extensas pesquisas sobre a linguagem, os tipos humanos e os costumes de pessoas pertencentes às classes marginalizadas. Já o francês Honoré de Balzac celebrizou-se pelo alto nível de detalhamento que conferia às suas descrições de ambientes.

Estas duas peculiaridades literárias influenciaram diretamente as técnicas aplicadas no New Journalism, definido por Gay Talese da seguinte forma em entrevista para o Jornal do Brasil:

New journalism (ou narrative writing, que seja) quer dizer apenas escrever bem. É um texto literário que não é inventado, não é ficção, mas que é narrado como um conto, como uma seqüência de filme. É como um enredo dramático digno de ser levado aos palcos e não apenas um amontoado de fatos, fácil de ser digerido. (2000)

Para a professora da Faculdade Cásper Líbero Nanami Sato, as principais características usadas para definir se um texto é representante do New Journalism são as seguintes:

A construção cena a cena; a reprodução do diálogo das personagens; a exploração das variadas possibilidades expressivas do foco narrativo (inclusive com o emprego do fluxo de consciência, como nos melhores romances psicológicos); o registro de gestos, cotidianos, hábitos, modos, estilo de decoração, roupas, comportamento e outros detalhes simbólicos, para reforçar a aparência da realidade. (apud Lucas Toyama, 2002)

Sérgio Vilas Boas define um pouco melhor as técnicas usadas pelos praticantes do New Journalism no trecho a seguir, extraído de seu supracitado artigo Jornalismo Literário e o Texto em Revista:

Inseriam diálogos - sim, com travessões e tudo. Faziam descrições minuciosas - de lugares, feições, objetos etc. Alternavam o foco narrativo: o narrador podia ser observador onipresente, testemunha e/ou participante dos acontecimentos. Além disso, podiam penetrar na mente dos seus personagens reais, reconstituir seus pensamentos, sentimentos e emoções com base em pesquisas e entrevistas verdadeiramente interativas. (2002)

Em seu livro The New Journalism, Tom Wolfe enumera os quatro principais procedimentos literários aplicados no New Journalism: a construção cena a cena, o uso de diálogos, o ponto de vista na terceira pessoa e os símbolos de status. Segundo Wolfe, estes quatro fundamentos seriam responsáveis pela força extraordinária que faz com que um texto torne-se apaixonante para quem o lê.

A construção cena-a-cena, o uso de símbolos de status e diálogos estão intimamente ligados às técnicas de captação de dados. É fácil perceber que para serem capazes de reproduzirem com maior fidelidade os acontecimentos e diálogos que constroem uma história, os jornalistas da época viam-se obrigados a participar efetivamente da vida dos seus personagens. Para escrever O Duque em seus Domínios, o famoso perfil de Marlon Brando para o The New Yorker, em 1956, Capote tornou-se tão próximo do ator que ele acabou esquecendo da sua condição de jornalista e acreditou que havia se estabelecido uma relação de amizade entre os dois. "Aquele pequeno canalha passou a metade da noite contando os seus problemas. Achei que o mínimo que poderia fazer era contar-lhe os meus" (Brando apud Instituto Gutenberg, 1998).

Quanto ao uso dos diálogos podemos afirmar que a sua presença, além de aproximar o formato do texto jornalístico ao de uma obra de ficção como o conto ou o romance, torna o ritmo da leitura mais agradável e, portanto, tem um poder muito maior de persuasão. Sobre este aspecto, Wolfe afirma que:

os escritores de revistas, como os primeiros romancistas, aprenderam a base de algo que desde então tem sido demonstrado nos estudos acadêmicos: isto é, que o diálogo realista cativa o leitor de forma mais completa que qualquer outro procedimento individual.(1976, p.50)

Além disso, os diálogos ajudam a compor com maior profundidade os personagens históricos ou tipificados, uma vez que através da sua linguagem, maneirismos e reações é possível informar muito mais e de maneira muito mais direta e precisa ao leitor do que por meio de descrições.

Quanto ao uso do ponto de vista na terceira pessoa, ele serve principalmente para dar ao leitor a sensação de estar presente na cena que está sendo descrita, experimentando as sensações através da focalização em uma personagem em particular, com a qual deve, necessariamente, identificar-se. Isto demonstra o quanto é importante a habilidade do autor em fazer com que os seus personagens despertem empatia nos seus leitores, justificando assim o emprego das outras duas técnicas supracitadas. O uso do ponto de vista na terceira pessoa permite também ao autor que varie o foco narrativo sem causar estranheza e nem pôr em risco a credibilidade do seu texto. Em um texto jornalístico (ou seja, claramente não-ficcional) escrito em primeira pessoa, seria impossível acreditar na hipótese de reproduzir com precisão os pensamentos de uma outra pessoa. Através de uma intensa bateria de entrevistas com cada personagem, contudo, é possível extrair-lhes confissões, segredos e outras particularidades de suas personalidades para, posteriormente, utilizar estas informações na confecção do texto.

A intensa descrição de gestos, hábitos e outras particularidades dos personagens não é gratuita e a sua função não se limita a enriquecer e enfeitar a narrativa. Vem a ser mais um recurso que demanda uma pesquisa bastante atenta e reverte-se em elementos que ajudam a aprofundar ainda mais o nível de informação que o leitor recebe sobre determinado personagem. Os símbolos de "status da vida" (Wolfe, 1976, p.51) ajudam o leitor a compreender melhor o lugar em que o personagem está situado no mundo. As descrições tanto de ambientes quanto de comportamentos são, em geral, bastante ricas, de modo a informar ao leitor o máximo possível.

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